A Serra das Talhadas, situada no coração de Portugal, nas proximidades de Proença-a-Nova, é um local de rara beleza, onde a natureza se encontra com o céu de uma forma que poucos lugares conseguem replicar. No verão, durante a noite, quando o silêncio toma conta das paisagens ondulantes e o mundo parece estar suspenso no tempo, um espetáculo grandioso se revela: a Via Láctea.
Numa noite clara, longe da poluição luminosa das cidades, a Via Láctea emerge como um manto brilhante
que atravessa o céu, pontilhado por milhões de estrelas que parecem sussurrar segredos do universo. A nossa galáxia, com os seus braços em espiral, estende-se por cima das nossas cabeças, formando um arco majestoso que domina o firmamento. É como se a própria Serra das Talhadas se tornasse um palco para um espetáculo cósmico, onde a Terra e o céu se encontram em perfeita harmonia.
Foi numa dessas noites de verão que decidi subir à serra, a partir da aldeia do Casalinho onde estava alojado. O Refúgio do Raposo do casal Francisco e Emília é um daqueles lugares na Terra que parecem não existir. Na verdade, no meu subconsciente, eu sabia que depois de uma noite à procura das estrelas, teria um delicioso bolo (especialidade da dona Emília), à minha espera em cima da mesa da cozinha.
Lá bem no alto, plantada sobre um enorme rochedo, podemos observar a Torre de vigia da autoria de Siza Vieira. Fazia-se sentir algum vento, apenas quebrado pelo som do rádio dos vigilantes que dia e noite permanecem na torre. O céu estrelado, a serra silenciosa, o som do rádio e eu próprio, parecíamos estar alinhados numa sincronia perfeita. Até o som do rádio parecia ligar-me aos cosmos. Naquele momento, eu não era apenas um observador; era parte daquele infinito, uma pequena peça na vastidão da Via Láctea.
E no regresso, já de madrugada, ainda houve tempo para saborear o bolo.