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Etiqueta: Panorâmica

A Via Láctea numa noite clara longe da poluição luminosa das cidades

Arco Via Láctea

A Serra das Talhadas, situada no coração de Portugal, nas proximidades de Proença-a-Nova, é um local de rara beleza, onde a natureza se encontra com o céu de uma forma que poucos lugares conseguem replicar. No verão, durante a noite, quando o silêncio toma conta das paisagens ondulantes e o mundo parece estar suspenso no tempo, um espetáculo grandioso se revela: a Via Láctea.
Numa noite clara, longe da poluição luminosa das cidades, a Via Láctea emerge como um manto brilhante que atravessa o céu, pontilhado por milhões de estrelas que parecem sussurrar segredos do universo. A nossa galáxia, com os seus braços em espiral, estende-se por cima das nossas cabeças, formando um arco majestoso que domina o firmamento. É como se a própria Serra das Talhadas se tornasse um palco para um espetáculo cósmico, onde a Terra e o céu se encontram em perfeita harmonia.
Foi numa dessas noites de verão que decidi subir à serra, a partir da aldeia do Casalinho onde estava alojado. O Refúgio do Raposo do casal Francisco e Emília é um daqueles lugares na Terra que parecem não existir. Na verdade, no meu subconsciente, eu sabia que depois de uma noite à procura das estrelas, teria um delicioso bolo (especialidade da dona Emília), à minha espera em cima da mesa da cozinha.
Lá bem no alto, plantada sobre um enorme rochedo, podemos observar a Torre de vigia da autoria de Siza Vieira. Fazia-se sentir algum vento, apenas quebrado pelo som do rádio dos vigilantes que dia e noite permanecem na torre. O céu estrelado, a serra silenciosa, o som do rádio e eu próprio, parecíamos estar alinhados numa sincronia perfeita. Até o som do rádio parecia ligar-me aos cosmos. Naquele momento, eu não era apenas um observador; era parte daquele infinito, uma pequena peça na vastidão da Via Láctea.
E no regresso, já de madrugada, ainda houve tempo para saborear o bolo.

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A vida é feita de pequenos momentos

A vida é feita de pequenos momentos. Pequenas coisas. Pequenos grandes amigos. Amigos que sabem estar. Amigos que sabem receber. E foi apenas isto que me levou a registar esta fotografia. Estávamos em 2018 e tive a oportunidade de conhecer o filho de dois professores, de nome Miguel e que me convidou a passar uns dias de férias numa pequena aldeia, de nome Casalinho lá para as bandas de Proença-a-Nova. Quando lá cheguei, nomearam-me fotógrafo residente (se bem que isso quase ou nunca se tenha aplicado, muito por minha culpa).

Depois de uma longa conversa á mesa, onde todos tivemos oportunidade de expor as opiniões acerca do meu trabalho, das minhas viagens em prol da consciência ambiental, das galáxias e até mesmo de quem sabe verdadeiramente de apicultura, foi-me lançado o desafio de visitar um local ali próximo, com o objetivo de o fotografar. Um local que poucos conhecem, perdido no meio das serranias, lá para as bandas de um tal “Fernando”. Pasmado com o que vi durante o dia, rapidamente imaginei fotografá-lo de noite. E tão depressa imaginei, como depressa chegou a noite prevista. Depois de quase 30 minutos aos saltos dentro de uma Peugeot do século passado, agarrando firmemente a câmera fotográfica, lá chegamos. Essa noite foi para testar o local, no que toca ao melhor enquadramento.

Cerca de um mês depois, numa noite de Verão regressei ao mesmo sitio. Agora em noite de Lua Nova, a pé e sem os solavancos da Peugeot, pois ao que parece “o motor não quis pegar”. Ok. Tudo bem. Quando se procura o que se quer, nada nos impede. E a vida deve ter destas coisas, destes condimentos para nos motivar e para nos motivarmos a nós próprios e aos que nos rodeiam. Por essa razão fui com dois amigos. A verdadeira razão porque os levei (os amigos), foi porque assim os mosquitos que habitam aquele lugar, tinham maior área de pele para picar. Bem tentei que o Miguel também fosse, pois como não tem cabelo, está mais exposto aos mosquitos e talvez isso evitasse que eu ficasse picado. Não tive sucesso. Saí de lá a contar os buracos na pele. Talvez tantos quanto o ruído existente nesta fotografia panorâmica, em virtude do elevado valor de ISO que tive de colocar nos parâmetros manuais da câmera. O sitio era escuro. Tão escuro que os morcegos aparentavam ser de cor branca.

Deixo aqui esse momento, resultante de uma composição de 14 fotografias verticais, obtidas com uma Sony α7R IV e uma objetiva 16-35mm f2.8. 10 segundos de exposição e ISO 6400. Clique na miniatura ao lado, para visualizar a fotografia em tamanho maior.

Panorâmica da Via Láctea

Panorâmica da Via Láctea. Clicar na imagem para ver a fotografia num tamanho superior.

No passado dia 31 de Agosto, estive no Parque Natural do Douro Internacional, nas proximidades da Aldeia de Pena Branca, a realizar um workshop de fotografia nocturna. Na noite anterior à do evento, fui para o terreno na expectativa de conseguir realizar uma fotografia que há já algum tempo idealizava. Eu queria imenso uma fotografia panorâmica, com a finalidade de mostrar à Via Láctea, que circunda o Planalto Mirandês, localizado no Nordeste Transmontano ao longo do Douro Internacional.

Apesar de ter chegado muito tarde ao local onde iria ficar alojado (Cimo da Quinta), ainda consegui tempo para registar este momento. A ânsia de “congelar” a galáxia em espiral onde vivemos era imensa. E essa ânsia acontece, não pelo facto de querer um troféu, antes sim porque os dias que temos disponíveis para o conseguir, não são assim tantos. Isto porque os meses do ano favoráveis à fotografia da Via Láctea, são apenas 2 (na minha opinião). Por outro lado temos de eliminar os dias de Lua Cheia e as condições climatéricas desfavoráveis, como chuva, nevoeiro, neblinas, nuvens, etc. E ainda há que contar com a vontade de cada um de nós, de ir para o terreno à noite, deixando para trás algumas coisas importantes.

Com todos estes impedimentos, é fácil de deduzir que as noites para fotografar a Via Láctea, não são assim tantas como parece. É pois necessária uma boa dose de coragem, dedicação, persistência e trabalho. Tudo isto justificado pela simples razão de que é preciso mostrar o local onde vivemos. Uma pequeníssima bola azul nesta imensa Galáxia. Que quer aceitem quer não, é indiferente se essa bola azul, lá está ou não. A Via Láctea será sempre Via Láctea, com ou sem Terra, com ou sem racionalidade.  Disso não haja a mais pequena dúvida.

No entanto, sabendo eu (e tu e todos nós) a dimensão da nossa “única casa”, será mais fácil percebermos a nossa dimensão e o quão insignificante somos para a vida no Universo. Ter noção da escala da Terra em relação a esta imensa Galáxia, é ter noção do nosso lugar. Percebemos assim que todos os conflitos pessoais e da Humanidade em geral, não têm qualquer razão de ser.

Por isso, não liguem muitas luzes, não iluminem o que não é preciso, pois todos nós necessitamos da luz das estrelas, para iluminar a nossa existência.

Aproveito o momento para agradecer aos participantes no workshop de fotografia nocturna em Miranda do Douro, (Diana Pinto, Alcides Meirinhos, João Miranda de Azevedo, Manuel Marques, Ricardo Leal e Luís Almeida), pela presença. Espero que tenham vivido uma experiência única e que tenham percebido que mais importante do que fazer fotografia, é viver e registar os momentos, num negativo, num ficheiro, ou na nossa memória.